Vai, vai, vai começar a brincadeira…

5 de outubro de 2011

Em homenagem ao Dia das Crianças, abriremos o mês de outubro com um post especial, que chega trazendo um texto de Adelsin, que, há vinte anos, vem observando atentamente os “movimentos naturais das crianças e da gente encantada do Brasil”, levantando, assim, um repertório significativo de brinquedos, brincadeiras, cantigas e histórias próprias da cultura das crianças brasileiras.

Construindo brinquedos 

(Adelsin) 

A capacidade de transformar os mais diversos materiais em ferramentas, instrumentos, objetos e brinquedos é uma das maiores qualidades manifestadas pelo ser humano desde o começo dos tempos. O convívio com a natureza fez com que o homem desenvolvesse a sua capacidade observadora e transformadora. As sementes caindo rodopiando das árvores levaram o ser humano menino a perceber a existência do eixo, da gravidade, da rotação e a inventar as hélices e os cataventos. As pedrinhas redondas viraram bolas. As combinações dos eixos com as bolas fizeram surgir, naturalmente, as rodas, as carroças, os carros e as máquinas.

Cada descoberta dos homens-meninos foi sempre acompanhada por uma invenção. A alegria de descobrir era sempre coroada com a possibilidade da transformação. O uso prático e cotidiano das invenções foi apenas uma consequência de algo muito mais importante que é o cumprimento do movimento criador do ser humano natural em convivência com a natureza do seu lugar.

Com a revolução industrial, o desenvolvimento tecnológico ganhou proporções inimagináveis para o homem dos séculos anteriores. Mas o que passou a mover as invenções não foi mais a natureza criadora, mas os interesses financeiros. Essa nova postura fez com que uma grande parte da humanidade tivesse acesso ao produto das novas invenções, mas sem participar do processo de sua criação. Aos poucos, as pessoas foram se distanciando da natureza e do seu movimento criador. Foram se esquecendo da sua capacidade de descobrir e inventar e passaram apenas a consumir ou a se especializar em uma pequena etapa do processo de produção.

Chegamos ao terceiro milênio com o homem dependente das facilidades tecnológicas, sabendo utilizar maravilhas da mecânica e da eletrônica, mas desconhecendo a alma dessas invenções. As populações de consumidores, que sucederam às de criadores, estão cada vez mais hipnotizadas, solitárias e imóveis diante das maravilhas da tecnologia. Esse quadro reflete a ruptura do ser humano com os movimentos da natureza. A consequência dessa atitude é o quadro preocupante da saúde planetária. O aquecimento global é o indicador mais claro e triste do “esfriamento humano”. Mas, para a nossa sorte, as crianças e algumas pessoas espalhadas pelos “grandes sertões” não perderam o seu movimento natural e nem a sua força criadora.

Na contramão dos sistemas de ensino que insistem em adequá-las à competitividade do mercado, as crianças resistem e buscam cumprir a sua natureza investigadora, inventiva e transformadora. Apesar de toda pressão imposta pelos meios de comunicação de massa, alguns indivíduos mantêm viva a ligação com a “mãe terra” herdada de seus antepassados. Por isso, cada gesto dessas pessoas e dessas crianças é carregado de sentido e de sabedoria. Assim sendo, as suas cantigas, histórias, comidas e brinquedos revelam o presente sagrado do passado e do futuro. Mas esses últimos representantes encantados da espécie humana só se mantiveram assim porque preservaram a própria natureza interna, tendo por referencial a natureza do seu lugar. E essa ralação foi estabelecida na infância. Por tudo isso, acredito que a humanidade só terá futuro se reconhecer a urgência da preservação dos territórios da infância, que começa em nosso quintal e abraça todo o planeta.

Formado em Artes Plásticas pela UFMG, o belorizontino Adelson Murta, o Adelsin, desenvolve trabalhos de observação e valorização da cultura da criança. Entre 1986 e 2003, viajou pelo interior de Minas Gerais e da Bahia, pesquisando, ensinando e aprendendo brinquedos artesanais da tradição popular. Trabalhou com crianças em escolas formais, alternativas, rurais, especiais, e ainda com meninos de rua em Belo Horizonte e Salvador. É autor do livro “Barangandão Arco-Íris – 36 brinquedos inventados por meninos e meninas”.

 

“A infância é o tempo de maior criatividade na vida de um ser humano.”
(Jean Piaget)

 

Cinema em muitas línguas

O Nono Festival Internacional de Cinema Infantil irá acontecer em dez cidades do Brasil. Em Belo Horizonte (MG), será na semana de 21 a 30 de outubro, no Pátio Savassi.
Confira programação no site: www.fici.com.br