Vitória da Democracia!

30 de novembro de 2022

Foto: Élida Murta

Vitória da Democracia!

No último dia 30 de outubro, o povo brasileiro exerceu, mais uma vez, o seu direito democrático de votar em eleições livres e diretas para escolher o Presidente da República. Numa disputa muito acirrada, em que o Brasil praticamente se dividiu, o candidato Luiz Inácio Lula da Silva venceu as eleições com mais de 60 milhões, trezentos e quarenta mil votos. Com essa vitória, em um jogo político que foi disputado de forma desigual,  Lula assume seu terceiro mandato e se torna o político que mais vezes, na história da República brasileira, foi eleito pelo voto direto para o comando do Palácio do Planalto.

          

Linha do tempo na história das reeleições brasileiras:
– Rodrigues Alves: 1902 e 1918
– Getúlio Vargas: eleito indiretamente em 1934 e diretamente em 1950
– Fernando Henrique Cardoso: 1994 e 1998
– Dilma Rousseff: 2010 e 2014
– Lula é o primeiro a ser eleito presidente da República pelo voto direto por três vezes: 2002, 2006 e 2022.


Apesar da vitória de Lula, em que se confirmou que o povo brasileiro acredita na democracia e quer ver o Brasil trilhar o caminho da liberdade e da justiça social, não se pode desconsiderar o fato de que o atual presidente, embora não tenha sido reeleito, obteve mais de 58 milhões, duzentos e cinco mil votos. Além do mais, a abstenção foi alta e chegou a 20,90%. O que isso significa? Significa que governar o Brasil a partir de 1° de janeiro de 2023 não será tarefa fácil para o novo governo e não será nada fácil para o povo brasileiro também.

O primeiro discurso do presidente eleito, feito ainda no clima da emoção do resultado e da disputa, foi em tom conciliador e confirmou quais serão as prioridades do seu governo:

“A partir de 1º de janeiro de 2023 vou governar para 215 milhões de brasileiros, e não apenas para aqueles que votaram em mim. Não existem dois Brasis. Somos um único país, um único povo, uma grande nação!”

Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

“O discurso de conciliação e paz feito por Lula pode ser um bom sinal para minimizar a guerra e ódio que existe hoje na sociedade brasileira devido às disputas políticas. Além disso, o governo que se formou com uma ampla frente democrática deve fortalecer a democracia brasileira que sofreu inúmeros ataques nos últimos tempos”.

Maria Teresa Kerbauy, professora e cientista política

Veja o discurso de Lula na íntegra


A urna eletrônica CONFIRMA o seu valor

O Tribunal Superior Eleitoral oficializou o resultado da eleição e o seu presidente, o ministro Alexandre de Moraes, elogiou o sistema de apuração, afirmando que essas eleições – no primeiro e no segundo turno – demostraram que os brasileiros confiam nas urnas eletrônicas e na justiça eleitoral. Não existe outro país no mundo que, 3h40 depois do término da votação, proclame o resultado com absoluta segurança, eficiência e competência. Embora o ministro tenha dito que a eleição se encerrou sem o risco de que o resultado das urnas pudesse ser contestado, infelizmente o que temos visto é o contrário disso. Muitos eleitores apertaram o CONFIRMA nas urnas, praticaram seu direito de votar, mas não souberam perder.

Tem gente que ainda não aceitou o resultado das urnas…

Homem que participava de protesto contra o resultado das eleições presidenciais em estrada do Rio Grande do Sul se agarra na dianteira de um caminhão para impedir a sua passagem e é levado por quilômetros. Ele não se feriu e também não foi preso.

Desde o dia 31 de outubro, vários grupos – que vamos identificar aqui como sendo de extrema direita – não aceitaram o resultado das eleições e vêm se manifestando, em vários pontos do país, de forma ilegal, irresponsável e muitas vezes violenta: bloqueios de avenidas e de estradas, acampamentos montados em frente a quartéis (pedindo, acreditem, a intervenção militar e a volta da ditadura!) e o desencadeamento de reações extremadas, que começam com provocações verbais e discussões, seguidas de violências individuais e coletivas, que já causaram prejuízos físicos e materiais, traumas e mortes. Um exemplo extremo é o da recente tragédia ocorrida no Espírito Santo, na cidade de Aracruz, que resultou em três mortes e 13 feridos. Tão chocante quanto o fato de ver grupos radicais contestando o resultado de eleições legítimas é a lentidão (e muitas vezes a conivência) das autoridades locais e federais em coibir e acabar com essas reações absurdas e criminosas. Algumas providências foram tomadas, mas ainda existem grupos acampados provocando confusões, atrapalhando o trânsito com suas barreiras, “fazendo continência para pneus”, tentando fazer “contatos imediatos com extraterrestres” e “vaiando telões e TVs” durante os jogos da Seleção brasileira na Copa 2022. Até agora ninguém foi preso. E isso é um absurdo!

“É hora de baixar as armas que jamais deveriam ter sido empunhadas.  Armas matam e nós escolhemos a vida”.
Luiz Inácio Lula da Silva

Não nos cabe aqui, além da nossa perplexidade e indignação, encontrar soluções fáceis para tudo isso que vem acontecendo atualmente no Brasil. Depois do nosso voto nas urnas, queremos dar o nosso voto de confiança a todos os brasileiros e brasileiras que já estão se mobilizando no processo de transição, que vem sendo dificultado permanentemente pelo atual governo. As dificuldades do processo de transição sinalizam para os desafios que todos temos pela frente. Ao novo governo caberá lidar e encontrar o equilíbrio para pontos delicados como o crescimento econômico interno e externo e a redução da desigualdade social que existe no país. Será preciso retomar programas sociais, programas de educação, trazer de volta a renda básica e, principalmente, ser firme no combate à fome e à violência.

“Esperamos que as eleições de 2022 no Brasil sejam a expressão de uma sociedade verdadeira e profundamente comprometida com a construção, o aprofundamento e o fortalecimento de sua democracia”. (Pactopelademocracia.org.br)

De nossa parte, podemos trabalhar o nosso compromisso social, defender as causas ambientais, combater a intolerância e o preconceito e acreditar que podemos vencer todas as dificuldades e diferenças na construção de uma vontade coletiva para que 2023 seja o início de um novo tempo para o povo brasileiro:

“Fé na vida, fé no homem, fé no que virá,

Nós podemos muito, nós podemos mais.

Vamos lá fazer o que será!”

Sementes do amanhã (Erasmo Carlos)


FUTEBOL X DEMOCRACIA

Copa do Mundo da Fifa 2002 – Brasil é Pentacampeão – Yokorama (Japão)

O Brasil é o único país do mundo que já participou de todas as Copas realizadas até hoje e é o único a ter conquistado a taça por cinco vezes. Somos pentacampeões e, na atual Copa, queremos conquistar mais um título: queremos ser hexacampeões do mundo! O futebol evoluiu, mudou regras, virou um negócio milionário e adotou um “padrão FIFA” para estádios e torcidas no mundo inteiro. O Brasil, famoso por seu “futebol arte”, também teve que se render aos novos tempos, às novas regras do esporte e perder a personalidade para não ficar para trás. Não podemos nos esquecer de que a corrupção, que muitas vezes envolve o universo do futebol, também evoluiu com ele. Apesar de tudo isso, ainda somos uma nação apaixonada por futebol e nossos craques estão espalhados pelo mundo inteiro. 

Recentemente na história do nosso país, ocorreu um fenômeno ligado ao movimento de adesão de parte da população brasileira à proposta de ultradireita do atual governo. Mobilizados pela desinformação e pela manipulação promovida e disseminada pelas fake news, grupos de perfil declaradamente fascista se apropriaram de dois símbolos nacionais como referências de sua identidade: a bandeira do Brasil e a camisa da nossa Seleção brasileira de futebol. Somos, em grande maioria, apaixonados por futebol e não somos de levar desaforo para casa. Sendo assim, passando por cima da fama histórica de corrupção que envolve a Fifa e seus patrocinadores, a Copa se apresentou aos brasileiros como uma oportunidade ideal para resgatar nossa bandeira (que é de todos), ressignificar o uso da camisa oficial da Seleção brasileira (a nossa Seleção Canarinho!) e recuperar nossa autoestima torcendo, de verde e amarelo, para o Brasil ganhar essa Copa. Tudo isso é política!

O Qatar, o Irã, as seleções e o Brasil: campo aberto (e minado) para posicionamentos e manifestações políticas

Foto: Kirill Kudryavtsev/AFP

Um homem invadiu o campo do Estádio Lusail durante a partida entre Portugal e Uruguai na Copa do Mundo de 2022. Ele carregava uma bandeira do movimento LGBTQ + e trazia na sua camiseta os dizeres “Salve a Ucrânia”, na frente, e “Respeito para Mulheres Iranianas”, nas costas. Ambas as frases são manifestações políticas. Portugal venceu por 2X0. O homem foi preso.

Qatar é um país pequeno e muito rico, mas é marcado por questões culturais, religiosas e políticas que envolvem os direitos humanos envolvem direitos humanos e o governo do país. Eles investiram muito para ser a sede desta Copa e garantiram que todos seriam bem-vindos. Inclusive a comunidade LGBT+.

A verdade é que no Qatar as mulheres são tratadas como inferiores e têm seus direitos atrelados à vontade e à lógica de um mundo machista. Ali as leis trabalhistas existem só no papel e os trabalhadores – especialmente os imigrantes – são explorados até a morte. A construção dos mega estádios para essa Copa foram palco para a violência dessa exploração. O homossexualismo é considerado crime. De acordo com as leis do Qatar, é proibido fazer manifestações que instiguem ou induzam apoio aos direitos desse grupo social. Pelo Código Penal do Catar, a pena para esse “crime” é de até 10 anos de prisão. Não se sabe o que aconteceu com o homem que invadiu o campo após a sua prisão. O que se sabe é que episódios envolvendo agressões a turistas por questões de gênero já foram relatados desde os primeiros dias do Mundial.

Diante desse quadro e apesar das proibições da Fifa, jogadores de muitos países, como a Holanda, a Inglaterra e o Irã, já se manifestaram de diversas formas contra o governo do Qatar.

O avião que levou atletas e torcedores da seleção da Alemanha pousou no Qatar com a frase “#Diversity Wins!” (#Diversidade vence!), numa mensagem clara ao respeito à diversidade de opiniões, de raças e de gênero.

Nos jogos da seleção iraniana, inúmeros torcedores protestaram em favor das mulheres do Irã. No primeiro jogo da equipe, contra o time da Inglaterra, os atletas iranianos também protestaram não cantando o hino do país no estádio.

Braçadeira usada pelo Capitão do time da Inglaterra.

O capitão do time da Inglaterra, Harry Kane, usou braçadeira escrita “No Discrimination” (ou seja, “Sem Discriminação”) durante sua estreia na Copa do Mundo de 2022. Outra manifestação, que partiu da Inglaterra, foi o ato de se ajoelhar, antes do jogo, em protesto contra casos de racismo. Isso aconteceu na partida contra o Irã, marcando a estreia dos ingleses no Mundial, mas já é uma prática adotada pela seleção há bastante tempo.

Para saber mais sobre manifestações contra a homofobia, o racismo e o machismo durante a Copa 2022 clique aqui.


Brasil, País do Futebol

Além da fama de ser um país apaixonado por futebol e que produz craques para os gramados do mundo inteiro, o Brasil tem sua história marcada por episódios em que futebol e política se misturam. Num período de nossa história, em que o país vivia um momento de transição social e política (1964-1984), muitas experiências de autonomia foram desenvolvidas por nossos atletas profissionais. Merecem destaque as práticas de liberdade instauradas pela nossa Seleção campeã de 1970, por diversos coletivos de atletas e, sobretudo, pelo movimento da Democracia Corinthiana, nos anos 1980.

Foto: Trecho do filme “Democracia em Preto e Branco”.

Na foto acima o time do Corinthians estampava no uniforme a chamada para eleições diretas de 15 de novembro de 1982  para a escolha do Governador do Estado de São Paulo.

Veja aqui o ótimo documentário Democracia em Preto e Branco, que conta toda a história da Democracia Corinthiana.


O segundo gol de Richarlison, marcado no jogo contra a Sérvia, já entrou para a história da nossa Seleção e do futebol brasileiro.

O Brasil continua sendo “o País do Futebol”. Cada Copa do Mundo jogada por nossas seleções, hoje pentacampeãs, teve seus craques e seus ídolos: Didi, Garrincha, o Rei Pelé, Tostão, Rivelino, Taffarel, Reinaldo, Sócrates, Romário, Ronaldinho Fenômeno, Ronaldinho Gaúcho, Roberto Carlos, Cafu, Neymar… entre tantos outros. A Copa de 2022, por tudo o que ela representa, já tem mais um nome inscrito no hall da fama dos jogadores brasileiros: Richalison de Andrade!

Além de marcar dois gols na partida de estreia da Seleção brasileira contra a Sérvia na Copa do Qatar, e da fama que adquiriu como craque e campeão olímpico pelo Brasil e pelo Tottenham, da Premier League inglesa, onde joga atualmente, o capixaba Richarlison é também conhecido por sua postura cidadã, sua preocupação com as questões sociais e suas atitudes comprometidas e solidárias.

Ele sempre se posiciona, não só nas redes sociais, por causas humanitárias e em defesa da vida. Em 2020, por exemplo, Richarlison se tornou embaixador do USP Vida, programa voltado para pessoas físicas e jurídicas que tenham interesse em fazer doações para as pesquisas e ações que a universidade paulista desenvolve no combate à Covid. Após a vitória contra a Sérvia, o nome de Richarlison e vários depoimentos seus viralizaram nas redes sociais do Brasil e do mundo.

Confira aqui um vídeo com um depoimento do nosso craque, dentro e fora dos campos de futebol.

Foto: Amr Abdallah Dalsh / Reuters

“Eu me posiciono porque as pessoas de onde venho não têm voz nem vez”.

Richarlison


Ficha Técnica deste post

Coordenação: Departamento Socioambiental Vina – Cláudia Pires Lessa
Texto: Élida Murta
Design Gráfico: Lika Prates